Imagem: IEA USP

“[…] o fluxo ininterrupto de mensagens, e-mails e notificações exige mudanças pequenas mas infinitas, tornando mais raros os momentos de relaxamento.”
Obra: Sofrimento não é doença. Nem todas as dores precisam de remédio, mas todas merecem cuidado. Sofrer adoece. Sextante, 2025, Rio de Janeiro. De Daniel Martins de Barros.
Ao passar por este trecho (p. 89), lembrei-me da envolvente correria da multitarefa, a qual Byung-Chul Han considera um “retrocesso” ligado à “sociedade do cansaço” [493].
Daniel Martins de Barros abre o capítulo a lembrar que o sofrimento é um alarme para o que nos perturba, fere, machuca, e nos impulsiona a alguma mudança que exigirá energia a envolver o organismo inteiro em um movimento cuja mobilização é coordenada pelo cérebro. Esta reação é chamada de “estresse” (p. 87), que pode ser imediata, para “fugir do perigo iminente”, ou mais lenta, quando se lida com o sofrimento de forma mais duradoura (p. 88).
Após discorrer o fascinante processo químico do estresse, desencadeado a partir do cérebro, nossa central de detecção de ameaça (p. 88), o médico do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, lembra que o mecanismo “foi projetado para disparar de vez em quando, de forma intermitente”, no entanto, a modernidade com toda a sua correria, tratou de torná-lo crônico, pela frequência, ocasionando no estresse contínuo. Nossos antepassados mais remotos, quando sob momentos de estresse, lidavam com o mesmo mecanismo, certamente de forma mais apropriada, dada à sua natureza intermitente, o que não é compatível com a frequência com que o acionamos no nosso corrido cotidiano ou, penso, na nossa “civilização”, cada vez mais avessa a momentos de relaxamento, tão devotada a uma correria selvagem.
Então pensei em quanta sabedoria há no ensinamento de Thich Nhat Hanh em Sem lama não há lótus, quanto ao “andar em meditação”, sobre a prática da “parada” para sinalizar que se está acima de toda essa correia, como forma de se cultivar a capacidade de cessar a si mesmo para outras atividades, além de possibilitar a permissão ao relaxamento e ao descanso [494].
O estresse em si não é um problema, pois representa um mecanismo de reação para dar subsídios a ajustes necessários em nossa condução diante de ameaças identificadas pelo cérebro, o que provoca sofrimento natural, penso, inevitável, como parte do processo. O problema a ser considerado de maior relevância está no uso constante de um dispositivo adequado para a intermitência, em situações pontuais, todavia, fatores externos ou socioculturais passaram a forçar o seu acionamento contínuo, gerando o “estresse ruim” (p. 89).
493. 28/11/2025 22h18
494. 11/11/2025 20h56